segunda-feira, 1 de junho de 2020

"Teus ombros suportam o mundo..."



        "... e ele não pesa mais que a mão de uma criança". Esse trecho pertence poema "Os Ombros Que Suportam O Mundo" escrito por Carlos Drummond de Andrade e, segundo um amigo próximo, era (e ainda é) a melhor forma de me descrever. E eu concordo totalmente que levo este pequeno trecho como parte de mim por muito tempo ao longo da vida. Mas o que de fato dizer que meus "ombros suportam o mundo" quer dizer? E por que esse mundo que eu carrego nas costas "não pesa mais que a mão de uma criança"? Bem, estes são os pontos de partida que pretendo desenvolver neste pequeno texto reflexivo - algo que não faço a bastante tempo no blog. Como primeira postagem de 2020, é o que eu realmente quero fazer.
       Do meu ponto de vista, "o mundo" trazido por Drummond se trata da nossa realidade, na nossa existência humana, de todo tipo de condição de vida, em suma, questões que implicam e perpassam a todos nós por sermos seres humanos. Esse "mundo" é composto de todas essas coisas, e elas podem ser situações que estão sendo vividas no momento presente, foram vividas no momento passado e também, principalmente, preocupações que cercam as vidas humanas. Para mim, esse "mundo" que pesa e que é suportado pelos "ombros" são justamente todas estas coisas. Está se referindo a alguém que sente o peso e que carrega todas essas preocupações porque tem consciência de que elas existem e acontecem e também estão acontecendo com várias pessoas no mundo. "Suportar" o "mundo" "nos ombros" significa que se trata de alguém que tem essa preocupação genuína com os outros e consigo, alguém que tem a empatia e a compaixão de pensar além dos seus problemas, mas também os dos outros que, muitas das vezes, encontram-se em escala maior. Certamente carregar o mundo nas costas tem uma conotação muito forte e pesada, no entanto é algo que parece ser carregado voluntariamente.
         Bem, se "o mundo" que é "suportado" pelos "ombros" é pesado, por que "ele não pesa mais que a mão de uma criança"? Porque não se trata de uma carga física, mas sim de algo abstrato: preocupações e pensamentos. Eles não têm peso em quilos e gramas, mas eles pesam e elas existem. Eu entendo que o "pesar" se trata de algo mais subjetivo, algo mais intrínseco ao emocional e é da ordem do abstrato. Problemas, preocupações, pensamentos podem pesar e esse peso pode ser sentido no corpo, pode ser refletido no próprio organismo, assim, o "mundo" ainda é algo que pesa e que é "suportado" pelos "ombros", trata-se de uma carga simbólica.
        Mas por que meus "ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão de uma criança"?
     Porque eu tenho uma preocupação genuína e pouco controlável acerca dos problemas humanos. Injustiça, violência, crueldade são coisas que me entristecem e impactam muito meu modo de ver o mundo. Eu apenas sinto, não é algo que posso controlar. Tenho plena consciência de que o mundo é feito de coisas boas e ruins e que elas convivem em todo lugar do mundo. Eu sei que não posso apenas focar no que é ruim e também não consigo viver ignorando que as coisas ruins acontecem e existem. Parece uma visão muito sofrida e talvez uma carga muito pesada, pois estou admitindo que suporto o mundo nos meus ombros, e ele tem um peso apesar de não ser algo concreto e perceptível aos demais. No entanto, eu não sei viver de uma outra maneira, não consigo me alienar ou escolher não falar de coisas de são da condição humana. Essa é a única forma que eu sei existir no mundo e, após reconhecer isso, eu não abro mão dela, pois, entendo que se abrir mão, eu vou perder toda a minha humanidade.
       Confesso que demorei bastante tempo e estou demorando muito para continuar meus textos no blog e também minhas próprias histórias, e isso se dá justamente por conta que precisei parar por um tempo e buscar uma forma de lidar com esse mundo que carrego nos ombros, que nos últimos meses se tornou mais pesado do que já costumava ser. E,  sempre respeitando meus movimentos e meu processo, suspendi por bastante tempo a escrita. Muitas vezes por não conseguir escrever, outras por não me sentir pronta ou na melhor condição para expressar o que penso e sinto nas palavras. Mas isso logo pra mim que escrevo? Que isso é parte de mim? Sim. É preciso respeitar minhas próprias limitações e fazer o possível com o que se pode agora. E é por isso que retornei por meio desta postagem, feita sem planejamento, sustentada apenas pela minha vontade de escrever.
         Por fim, conciliando meu processo individual e o que eu sinto, consegui encontrar formas de "suportar o mundo", existem várias, a minha forma mais importante é a escrita.

Até a próxima postagem!

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