sábado, 22 de junho de 2019

Machado de Assis e a mudança subjetiva do escritor



      Nesta postagem resolvi falar um pouco sobre algo que tem me tomado bastante reflexão nos últimos meses, principalmente sobre o quanto a obra reflete o autor que escreve, principalmente sobre o que se pensa, o que se acredita e, claro, o estilo literário e a forma de escrever. Sendo assim, no dia de ontem (21 de junho), nos 108 anos do mestre Machado de Assis, eu o menciono justamente por ele ter feito uma pequena menção da mudança subjetiva do autor e a relação com sua obra em um de seus primeiros romances: Helena. A princípio me chamou a atenção por ser algo pequeno, no entanto reflete em toda pessoa que aspira em escrever e quem é escritor, principalmente quando se revisita seus textos mais antigos.
      Apesar de ser mais conhecido e mais evidenciado pelas suas obras de cunho Realista/Naturalista, Helena foi um dos primeiros romances da fase Romântica do Machado de Assis. Originalmente publicado em folhetins em 1876, Helena se encontra hoje em domínio público (aqui) e sua versão apresenta uma Advertência do próprio autor no qual ele se explica a respeito de seu viés romanesco nesta obra, o que evidencia a diferença entre suas produções no início de sua carreira e as outras demais que tenho cunho reflexivo, crítico e político. Assim, Machado adverte o leitor em dois pequenos parágrafos:
Esta nova edição de Helena sai com várias emendas de linguagem e outras, que não alteram a feição do livro. Ele é o mesmo da data em que o compus e imprimi, diverso do que o tempo me foi depois, correspondendo assim ao capítulo da história do meu espírito, naquele ano de 1876.
Não me culpeis pelo que lhe achardes romanesco. Dos que então fiz, este me era particularmente prezado. Agora mesmo, que há tanto me fui a outras e diferentes páginas, ouço um eco remoto ao reler estas, eco de mocidade e fé ingênua. É claro que, em nenhum caso, lhes tiraria a feição passada; cada obra pertence ao seu tempo. 
      Este pequena trecho tem bastante sentido e está diretamente ligado a mudança subjetiva do escritor de forma geral. Ao se referir que sua obra Helena corresponde como "capítulo da história do meu espírito", Machado nos diz que a obra constituída fora feita a pessoa que ele foi naquele dado momento, alguém que escreveu no estilo de romance Romântico. No entanto, após retornar a esta obra após algum tempo, observa-se que não se trata mais do mesmo escritor que a fez, trata-se de um escritor com perspectiva e visões totalmente diferentes. E é justamente aqui que Machado faz sua observação meio que indireta sobre como a  obra reflete o que o escritor é no momento que a escreve e que  se percebe a diferença se comparado aos escritos posteriores. Portanto ele encerra se referindo que: "cada obra pertence a o seu tempo". De forma nenhuma renegaria a pessoa que foi e que escreveu uma obra muito diferente das demais que viriam se tornaram seu maior destaque como escritor e que são de cunho Realista, político e de crítica a própria conduta e comportamento humano.
       Nesta Advertência que se encontra em Helena, Machado de Assis se revela mais uma vez fantástico ao enunciar com sutileza a relação do escritor com sua obra, algo que para quem está habituado a ler e escrever consegue perceber e acompanhar sua própria mudança no pensar a partir dos textos que escreve, seja no estilo de escrita e principalmente no conteúdo. Machado foi um mestre para vários escritores e um grande nome na literatura brasileira, e creio que ele faz jus ao reconhecimento que lhe foi dado, esta Advertência fora uma pequena demonstração disso. 
      Por considerar que cada produção literária é escrita a partir da junção de observação, imaginação e experiência, cada texto reflete o que o seu autor é, o que acredita, o que pensa e sua visão de mundo mesmo que de forma indireta. Assim, quando penso sobre a mudança que ocorre em cada pessoa, penso também sobre as minhas postagens mais antigas neste blog e também nas minhas primeiras histórias: todas são demonstrações do que fui e do caminho que fiz para chegar até aqui. O texto do Machado me fez pensar em considerar cada vez mais o valor de cada texto, assim como, me levou a compreender e aceitar que cada obra realmente pertence ao seu próprio tempo.

Até a próxima postagem!


Referências e Imagens

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